Por Nick Stoico e Alexa Coultoff – Boston Globe
O jornalista investigativo aposentado Phillip Martin, de 71 anos, afirmou ter sido impedido de ser atendido em uma cafeteria de Cambridge, Massachusetts, após funcionários o confundirem com outra pessoa que teria causado problemas no local anteriormente. Martin, que trabalhou por mais de duas décadas na emissora GBH e foi o primeiro correspondente nacional da NPR dedicado à cobertura de questões raciais, relatou que o episódio ocorreu na última quinta-feira, quando se encontrou com outra jornalista no Caffè Nero, em Central Square.
Segundo Martin, ao tentar pedir um chá, foi informado por uma funcionária do balcão que, por orientação do gerente, não poderia ser atendido caso voltasse ao estabelecimento. O jornalista explicou que deveria estar sendo confundido com outra pessoa, mas a funcionária insistiu, dizendo: “Não, temos você em vídeo”.
Diante da situação, tanto Martin quanto a funcionária acionaram a polícia. Após conversarem separadamente com os envolvidos, os policiais permitiram que Martin permanecesse no local. O porta-voz da polícia de Cambridge, sargento Bob Reardon, classificou o caso como um “mal-entendido”.
Em nota enviada por e-mail, um porta-voz do Caffè Nero afirmou que a situação foi “um caso genuíno de identidade equivocada, devido à semelhança de altura, porte físico, barba e óculos com um cliente que havia causado sérios transtornos anteriormente”. Ainda segundo a cafeteria, uma semana antes, outro cliente foi retirado do local após ser agressivo com os funcionários e urinar dentro da loja. “Embora não seja aceitável confundir um cliente com outro, o incidente anterior foi traumático para a barista envolvida e desencadeou sua reação”, explicou o porta-voz. “Todos no Caffè Nero lamentam profundamente o ocorrido com o Sr. Martin, que não deveria ter acontecido, mesmo sendo um erro motivado por uma experiência recente.”
A empresa informou ainda que toda a equipe da loja passará por treinamento para evitar que situações semelhantes se repitam.
Sentindo-se humilhado, Martin registrou queixas contra o Caffè Nero na Comissão de Direitos Humanos de Cambridge e na Comissão de Combate à Discriminação de Massachusetts. “É compreensível que estejam preocupados com furtos ou pessoas em situação de rua, mas precisam adotar uma política que garanta absoluta certeza sobre quem estão abordando”, afirmou Martin em entrevista. “Não podem fazer suposições baseadas apenas na aparência, pois isso alimenta os piores estereótipos.”
Martin chegou ao café pouco antes das 17h para se encontrar com Naomi Kooker, jornalista freelancer e professora de jornalismo no Regis College. Kooker, que já estava sentada com sua bebida, contou que ouviu Martin conversando com a funcionária, mas não presenciou toda a situação. Ela se aproximou quando percebeu que Martin estava ligando para a polícia, ao mesmo tempo em que a funcionária também fazia uma chamada.
De acordo com o porta-voz da polícia, os agentes foram chamados para atender a uma ocorrência inicialmente registrada como “pessoa indesejada”. Após esclarecimentos, ninguém foi retirado do estabelecimento.
Depois da intervenção policial, Martin e Kooker permaneceram cerca de dez minutos no local, mas ele não chegou a receber o chá que havia pedido. “Não queria dar a satisfação de terem me expulsado”, disse Martin. “Não compramos mais nada, mas ficamos, porque sair seria uma vitória para esse tipo de preconceito.”
Enquanto aguardavam a chegada da polícia, Kooker gravou uma breve entrevista com Martin em seu celular, na qual ele relatou o ocorrido. Questionado se já havia passado por situação semelhante, Martin respondeu que não naquele café, mas lembrou de três ou quatro episódios parecidos na juventude.
Crescido em Detroit nos anos 1960, Martin contou que, aos 14 ou 15 anos, foi abordado por policiais ao voltar do trabalho em um supermercado, sob a justificativa de que se parecia com um suspeito de crime. “Esse tipo de coisa aconteceu comigo mais de uma vez na juventude, e obviamente não tinha nada a ver comigo”, relatou. “No mundo do racismo e da discriminação, ‘alguém que se parece com você’ é algo recorrente. Essas situações são baseadas em estereótipos.”
Martin afirmou não desejar que a funcionária perca o emprego, mas espera que haja responsabilização e mudanças nas políticas da loja para evitar que outros clientes passem pela mesma experiência. “São trabalhadores fazendo seu serviço, mas claramente receberam uma orientação equivocada”, concluiu.
Foto: Meredith Nierman/GBH News
Fonte: Boston Globe







