Por Ximena Bustillo – NPR
WASHINGTON, D.C. — A recente redução de cargos em escritórios de fiscalização interna do Departamento de Segurança Interna dos Estados Unidos (DHS, na sigla em inglês) está gerando preocupação entre ex-funcionários e defensores dos direitos dos imigrantes. Eles alertam que a falta de supervisão pode levar a um aumento de abusos, negligência e até mortes em centros de detenção administrados pelo Serviço de Imigração e Alfândega (ICE).
Jennifer Ibañez Whitlock, ex-assessora de políticas e hoje atuando no National Immigration Law Center, lembra que orientava advogados de imigração a dizerem aos clientes detidos para procurarem o logotipo de um beija-flor, símbolo dos gerentes de caso do Escritório do Ombudsman de Detenção de Imigração. Esse era um dos três escritórios criados pelo Congresso para supervisionar as condições de detenção e garantir o respeito aos direitos civis e liberdades individuais dos imigrantes.
Esses escritórios, incluindo o Escritório de Direitos Civis e Liberdades Civis (CRCL), tinham como função responder a denúncias de maus-tratos, garantir acesso a medicamentos e alimentação adequada, além de investigar casos de isolamento forçado, abuso sexual e até situações envolvendo bebês em detenção.
No entanto, durante o governo Trump, centenas de cargos nesses escritórios foram eliminados sob o argumento de corte de custos e por serem considerados “adversários internos que atrapalham as operações”. A medida afetou diretamente os funcionários responsáveis por visitar centros de detenção, investigar denúncias e elaborar relatórios obrigatórios ao Congresso.
Sem esses canais de fiscalização, defensores de imigrantes têm recorrido a parlamentares para tentar resolver problemas urgentes. “Isso é como uma explosão pontual, não uma solução contínua”, disse Whitlock.
Quatro ex-funcionários, que agora movem uma ação judicial contra suas demissões, relataram à NPR que suas funções eram essenciais para prevenir violações de direitos civis. Eles também destacaram que, com a recente ampliação do número de vagas em centros de detenção, impulsionada por um aumento de verbas aprovado pelo Congresso, a ausência de supervisão interna agrava ainda mais os riscos.
“Mais pessoas vão morrer sob custódia porque não haverá o mesmo nível de controle interno”, afirmou um ex-funcionário do CRCL, sob anonimato por medo de retaliações. “E o público americano nem saberá, porque não haverá ninguém para receber essas denúncias.”
O DHS afirma que o CRCL continua exercendo suas funções legais “de forma eficiente e econômica, sem comprometer a missão de segurança do país”, segundo a porta-voz Tricia McLaughlin. No entanto, não foi informado quantos funcionários ainda permanecem ativos nos escritórios de fiscalização.
Em 2025, pelo menos 15 pessoas morreram sob custódia do ICE, entre mais de 59 mil detidos, o maior número de mortes desde 2020 e o maior total de detidos em seis anos, segundo dados públicos da agência. Embora as mortes representem uma pequena fração, especialistas alertam que isso não reflete outras violações, como superlotação, falta de higiene e problemas no acesso à saúde e alimentação.
Katerina Herodotou, ex-assessora sênior de políticas do CRCL, teme que materiais informativos sobre direitos dos detidos, como cartazes com números de contato, tenham sido removidos. “Pode parecer pouco, mas para alguém sofrendo abuso ou discriminação, faz toda a diferença”, afirmou.
Mais de 300 funcionários dos três escritórios de fiscalização receberam aviso de demissão este ano, como parte de um esforço mais amplo para reduzir o tamanho do governo federal. Cerca de 86 deles entraram com uma ação na Merit Systems Protection Board (MSPB), órgão que analisa recursos de funcionários públicos federais.
Segundo a advogada Marlene Laimeche, do escritório Gilbert Employment Law, o DHS não tem autoridade legal para eliminar funções determinadas pelo Congresso. “Eles afirmam que continuam cumprindo essas funções, mas não apresentaram provas”, disse.
A preocupação dos ex-funcionários vai além da legalidade das demissões. Eles temem que a falta de fiscalização transforme o governo em um instrumento de execução das prioridades presidenciais, sem equilíbrio de poderes.
Herodotou, por exemplo, relata que sua equipe estava sobrecarregada com denúncias justamente quando os cortes começaram. “Já estamos vendo os efeitos: mais problemas de saúde, mais mortes em detenção. E agora, não sei se ainda existe algum caminho para essas pessoas receberem ajuda”, concluiu.
Foto: Giorgio Viera/AFP via Getty Images
Fonte: NPR