Por Grace Moon – The Washington Post
A doença de Chagas, causada pelo parasita Trypanosoma cruzi e transmitida pelo inseto conhecido como “barbeiro” ou “kissing bug” (em inglês), passou a ser considerada uma enfermidade presente de forma constante nos Estados Unidos. O alerta foi feito neste mês pelos Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC), órgão de saúde pública do governo norte-americano.
A classificação de uma doença como presente de forma constante, ou seja, com ocorrência contínua em uma região, indica que ela está estabelecida em uma determinada população. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), mais de 100 milhões de pessoas no mundo estão em risco de contrair a doença de Chagas.
A infecção é provocada pelo parasita Trypanosoma cruzi, presente nas fezes do barbeiro, inseto que costuma picar o rosto das pessoas (daí o apelido “kissing bug”). A transmissão ocorre quando as fezes contaminadas entram em contato com feridas abertas, olhos ou boca. Também é possível haver transmissão de mãe para filho durante a gestação ou por transfusão de sangue contaminado, embora essas formas sejam menos comuns.
Animais domésticos, como cães, também podem ser hospedeiros do parasita. Há registros crescentes de infecções caninas em estados como Texas e Califórnia.
A doença de Chagas apresenta duas fases: aguda e crônica. A fase aguda ocorre nas primeiras semanas ou meses após a infecção e pode ser assintomática ou causar sintomas leves, como febre, fadiga, dores no corpo e inchaço nas pálpebras. O CDC destaca a importância de buscar tratamento ainda nessa fase.
Sem tratamento, a doença pode evoluir para a fase crônica, que pode durar anos ou até a vida inteira. Cerca de 30% dos infectados desenvolvem complicações graves, como insuficiência cardíaca ou dilatação do esôfago e do cólon. Outros permanecem sem sintomas, mas ainda assim podem estar infectados.
“A doença muitas vezes é fatal quando os sintomas aparecem”, afirmou Paula Stigler Granados, professora associada da Escola de Saúde Pública da Universidade Estadual de San Diego.
Casos autóctones, ou seja, não importados, de Chagas já foram identificados em pelo menos oito estados norte-americanos: Califórnia, Arizona, Texas, Tennessee, Louisiana, Missouri, Mississippi e Arkansas.
Peter Hotez, reitor da Escola Nacional de Medicina Tropical do Baylor College of Medicine, destacou que ainda há uma percepção equivocada de que a doença afeta apenas países de baixa e média renda. “Na verdade, há uma porcentagem significativa desses casos em países ricos como os EUA”, afirmou.
Segundo o CDC, os barbeiros ocorrem naturalmente na metade sul dos Estados Unidos e já foram identificados em 32 estados. Esses insetos também são comuns em áreas rurais do México, América Central e América do Sul.
Atualmente, não existem vacinas ou medicamentos preventivos contra a doença de Chagas. Nos Estados Unidos, dois medicamentos antiparasitários foram aprovados pela FDA (agência reguladora de alimentos e medicamentos) para tratar pessoas infectadas.
Para quem viaja a regiões onde a doença é comum, o CDC recomenda medidas de prevenção, como evitar alimentos crus ou mal lavados, usar roupas que cubram a pele e aplicar inseticidas de longa duração em áreas de risco. O inseto transmissor costuma se esconder em frestas de casas mal construídas, mas também pode sobreviver ao ar livre.
Donos de animais de estimação também devem estar atentos: o uso de medicamentos antipulgas e carrapatos, como Nexgard e Bravecto, pode ajudar a proteger os pets.
Apesar do reconhecimento da doença como presente de forma constante ser um avanço, especialistas alertam para a falta de vigilância ativa e recursos para monitoramento. “Se você não procura, não encontra e esse tem sido um grande problema”, disse Hotez. Granados reforça: “Rotular como presente de forma constante é um bom primeiro passo, mas isso não muda o fato de que não temos um sistema de vigilância sistemático nem os recursos necessários para sustentá-lo.”
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Fonte: The Washington Post