O governo dos Estados Unidos adotou uma nova e controversa estratégia para tentar forçar a saída de imigrantes indocumentados: mais de 6 mil pessoas, a maioria de origem latina, foram incluídas pela Administração da Seguridade Social (SSA) em um banco de dados federal que registra pessoas falecidas — mesmo estando vivas. A medida, solicitada pela secretária de Segurança Interna, Kristi Noem, tem como objetivo cortar o acesso desses imigrantes a benefícios e empregos legais, pressionando-os a deixar o país voluntariamente.
De acordo com fontes ligadas ao governo e documentos obtidos pelo The Washington Post, os nomes foram inseridos no chamado Death Master File, uma base de dados usada por agências federais, bancos e empregadores para verificar se alguém está vivo e apto a receber benefícios, como aposentadoria, auxílio-desemprego, financiamento estudantil, entre outros.
A Casa Branca afirma que os alvos iniciais da medida são imigrantes com ligações com atividades terroristas ou antecedentes criminais, embora o governo não tenha apresentado provas. Segundo um funcionário da Casa Branca, alguns dos nomes estariam na lista de vigilância do FBI. No entanto, a inclusão de pessoas vivas nessa lista levanta sérias preocupações legais e éticas. Funcionários atuais e ex-funcionários da SSA alertam que a prática pode violar leis de privacidade e causar sérios impactos na vida dos afetados, como perda de emprego, bloqueio de contas bancárias e dificuldades para alugar imóveis.
“O presidente Trump prometeu deportações em massa e, ao remover o incentivo financeiro para que imigrantes ilegais venham e permaneçam, vamos encorajá-los a se auto-deportarem,” disse Elizabeth Huston, porta-voz da Casa Branca. “Ele está cumprindo a promessa que fez ao povo americano.”
A medida faz parte de uma ofensiva mais ampla da administração Trump para endurecer as políticas migratórias. Além da SSA, outras agências estão sendo envolvidas. O Departamento de Segurança Interna (DHS) firmou recentemente um acordo com a Receita Federal (IRS) para acessar dados fiscais de imigrantes indocumentados. O comissário interino do IRS renunciou após a decisão polêmica.
Por trás da estratégia está a equipe DOGE, liderada por Elon Musk, que vem atuando para cortar custos e reestruturar agências federais. Originalmente focada em reduzir gastos e enxugar quadros na SSA, a equipe DOGE passou a se envolver diretamente em ações de imigração, como o uso de bases de dados e a criação de novas listas de inelegibilidade.
Uma dessas listas inclui *800 mil pessoas com ordens finais de deportação, cujo banco de dados foi repassado à SSA na semana passada. A ideia é ampliar o número de imigrantes afetados pela estratégia, começando com os que têm antecedentes criminais e, em seguida, incluindo até mesmo aqueles sem histórico de crimes.
O plano é expandir o uso da lista de mortos para incluir também 92 mil imigrantes com algum tipo de condenação criminal e, depois, qualquer pessoa considerada indocumentada que possua um número válido da Seguridade Social. A inclusão na base de dados também afeta o sistema E-Verify, usado por empresas para checar a elegibilidade de empregados — o que pode impedir essas pessoas de conseguirem ou manterem seus empregos legalmente.
Especialistas alertam que essa abordagem transforma um sistema criado para fins administrativos em uma ferramenta de deportação. Em comunicado recente, a própria SSA reconheceu que ser erroneamente declarado morto pode causar “graves dificuldades financeiras”.
A medida está sendo criticada por ativistas e especialistas em imigração como uma violação dos direitos básicos e um uso abusivo da máquina pública para fins políticos. Ainda assim, o governo Trump parece determinado a seguir com a estratégia, mesmo diante de possíveis ações judiciais e da pressão de organizações civis.
Além disso, o histórico da administração mostra falhas graves em políticas migratórias anteriores. Entre os casos mais emblemáticos estão a deportação equivocada de um homem de Maryland para uma prisão em El Salvador e a ordem, posteriormente cancelada, para que cidadãos ucranianos deixassem o país.
A decisão marca mais um capítulo da política migratória agressiva da atual administração, que já envolveu deportações sem audiência judicial, prisões em massa e uso de agências sem experiência em imigração para executar detenções. Agora, com o envolvimento da equipe DOGE e o uso de bancos de dados como ferramentas de exclusão, o governo intensifica sua campanha para reduzir drasticamente a presença de imigrantes indocumentados no país.
Foto: The New York Times